terça-feira, 23 de março de 2010

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"Life is nothing until it is lived; but it is yours to make sense of, and the value of it is nothing else but the sense that you choose."

((Jean-Paul Sartre))
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A vida não é nada até ser vivida; mas cabe a você dar-lhe sentido, e o valor dela não é nada mais que o sentido que você escolhe.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Capítulo XI

Quem roubou as tortas?

"O Rei e a Rainha de Copas estavam sentados em seus tronos quando eles chegaram, com uma multidão em volta...todo tipo de pequenos pássaros e animais além de todas as cartas do baralho: o Valete estava parado na frente deles, acorrentado, com um soldado em cada lado o guardando; e perto do Rei estava o Coelho Branco, com uma trombeta em uma mão e um pergaminho na outra. Bem no meio da corte havia uma mesa, com um grande prato de tortas sobre ela: elas pareciam tão deliciosas que Alice ficou com fome só de olhá-las e pensou “Tomara que o julgamento termine logo e eles sirvam o lanche!”. Mas parecia que a coisa não tinha chance e então, para passar o tempo, ela começou a olhar para tudo em volta.

Alice nunca estivera numa corte de justiça antes, mas já tinha lido sobre elas nos livros e estava satisfeita por perceber que sabia o nome de quase tudo em volta. “Aquele é o juiz”, ela disse para si mesma, “por causa da sua grande peruca.”

O juiz, aliás, era o Rei, que vestia a coroa sobre a peruca (vejam o frontipício do livro, se vocês quiserem ver como ele fazia isso). Ele não parecia muito confortável e com certeza não estava muito charmoso também.

“E aquele é o lugar destinado aos jurados”, pensou Alice, “e aquelas doze criaturas” (ela foi obrigada a pensar “criaturas”, sabe, porque algumas eram animais e outras eram pássaros), “suponho que sejam os jurados”. Ela repetiu a última palavra duas ou três vezes para si mesma, bastante orgulhosa disso: pois pensava, com razão, que muito poucas meninas da sua idade sabiam o significado dessa palavra. Entretanto se ela tivesse dito “membros do júri” também estaria certa.

Os doze jurados estavam escrevendo muito ocupados em suas lousas.

“O que eles estão fazendo?”, Alice sussurrou para o Grifo. “Eles não tem nada para escrever ali, antes de o julgamento começar.”

“Eles estão colocando seus nomes”, o Grifo sussurrou em resposta, “pois estão com medo de esquecê-los antes do julgamento terminar.”

“Que estúpidos!”, Alice começou a falar de alto e bom som, mas logo parou pois o Coelho Branco gritou “Silêncio na corte!” e o Rei colocou seus óculos para olhar ansiosamente em volta, procurando quem estava falando.

Alice podia ver, tão bem como se estivesse olhando por cima dos ombros, que todos os jurados tinham escrito “Que estúpidos!” em suas lousas e pôde ver também que um deles estava em dúvida sobre a grafia correta de “estúpidos” e tinha pedido para seu vizinho dizer para ele. “Uma bela bagunça vão estar as lousas até o final do julgamento!”, Alice pensou consigo mesma. Um dos jurados tinha um giz que rangia. Isso, é claro, Alice não agüentava, e então ela deu a volta na corte até chegar atrás dele e na primeira oportunidade arrancou-lhe o giz. Alice fez isso tão rápido que o pobre pequeno jurado (era Bill o Lagarto) não pôde perceber o que tinha acontecido: então, depois de procurar por toda parte ele foi obrigado a escrever com o dedo o resto do dia. É claro que não adiantava nada, pois não deixava marca nenhuma na lousa. “

Arauto, leia a acusação!”, ordenou o Rei.

Nesse momento, o Coelho Branco assoprou três vezes a trombeta e a seguir desenrolou o pergaminho, lendo o que se segue:

"A Rainha de Copas fez algumas tortas,Em um dia de verão:O Valete de Copas roubou todas elas,E levou embora sem hesitação.”

“Pensem no veredito”, disse o Rei para o júri. “Ainda não, ainda não!”, o Coelho interrompeu com pressa. “Há muito o que fazer antes disso!” “Chame a primeira testemunha”, o Rei disse, e o Coelho Branco assoprou três vezes sua trombeta, chamando a seguir: “Primeira testemunha!” A primeira testemunha era o Chapeleiro. Ele chegou com uma xícara de chá em uma das mãos e um pedaço de pão com manteiga na outra. “Eu peço-lhe desculpas sua Majestade”, ele começou, “por trazer estas coisas, mas eu ainda não tinha terminado meu chá quando fui chamado.” “Você deveria ter terminado”, disse o Rei. “Quando você começou?” O Chapeleiro olhou para a Lebre de Março, que o tinha seguido até à corte de braços dados com o Leirão. “Catorze de março, eu acho que era”, ele respondeu. “Quinze”, disse a Lebre de Março. “Dezesseis”, disse o Leirão. “Escrevam isso” o Rei disse para o júri; e os jurados apressaram-se em escrever as três datas em suas lousas, somando-as e chegando a uma conta maluca que incluía valores em dinheiro. “Tire seu chapéu”, o Rei ordenou ao Chapeleiro. “Não é meu”, respondeu o Chapeleiro. “Roubado!”, o Rei exclamou, virando-se para o júri, que no mesmo instante anotaram o fato. “Eu os tenho para vender”, o Chapeleiro continuou com sua explicação. “Nenhum deles é meu. Eu sou um chapeleiro.” Nesse instante a Rainha colocou seus óculos e começou a encarar o Chapeleiro, que empalideceu e inquietou-se. “Faça seu depoimento”, disse o Rei, “e não fique nervoso, ou eu mandarei executá-lo imediatamente.” Essa frase parece que não encorajou a testemunha, que começou a ficar sobre apenas um pé, alternando, olhando inquietamente para a Rainha. Na confusão acabou mordendo um pedaço da sua xícara de chá ao invés de morder seu pão com manteiga. Exatamente nessa hora Alice teve uma curiosa sensação, que a perturbou bastante até que ela percebesse o que se estava passando: Alice estava começando a crescer novamente. No início ela achou que deveria levantar-se e deixar a corte, mas depois decidiu ficar enquanto houvesse espaço para ela. “Eu queria que você não me espremesse tanto”, disse o Leirão, que estava sentado ao seu lado. “Eu quase não consigo respirar.” “Eu não posso ajudá-lo. Eu estou crescendo.” “Você não tem o direito de crescer aqui”, disse o Leirão. “Não fale bobagens”, respondeu Alice destemidamente, “você sabe que você está crescendo também.” “Sim, mas eu estou crescendo em uma velocidade razoável”, retrucou o Leirão, “e não desse jeito ridículo.” A seguir ele levantou-se com irritação e atravessou a sala até chegar do outro lado da corte. Todo o tempo a Rainha não tirou os olhos do Chapeleiro e, no instante que o Leirão atravessou a corte, ela ordenou a um dos oficiais da corte: “Tragam-me a lista dos cantores no último concerto!”. O coitado do Chapeleiro começou a tremer tanto que seus sapatos escorregaram dos pés. (...)"
((Alice no País das Maravilhas))

João e o pé de feijão

João e o pé de feijão é um conto de fadas de origem inglesa. A versão conhecida mais antiga é a de Benjamin Tabart, publicada em 1807 e popularizada por Joseph Jacobs em 1890, com a publicação de English Fairy Tales. A versão de Jacobs é mais comumente publicada atualmente, e acredita-se que seja mais próxima e fiel às versões orais do que a de Tabart, porque nesta falta a moral que há naquela.

A história conta que um menino chamado João vai ao mercado a mando de sua mãe com o objetivo de vender uma vaca. Quando João chega ao mercado, um estranho lhe propões cinco feijões mágicos em troca da vaca. João aceita a barganha e retorna para casa com os feijões no bolso. A mãe fica furioso por ele não ter seguido suas instruções de vender a vaca e joga os feijões pela janela. Enquanto João dorme, os feijões germinam e dão origem a gigantes pés de feijão. João ao acordar, escala o pé de feijão e chega a uma terra acima das nuvens. Este lugar é habitado por um gigante que se alimenta de seres humanos.
João é protegido pela esposa do gigante e consegue fugir dali depois de roubar uma sacola de moedas de ouro. João retorna no dia seguinte e rouba a galinha dos ovos de ouro do gigante e mais uma vez consegue escapar ileso. No terceiro dia, João volta à terra do gigante para roubar uma harpa de ouro. Dessa vez, o gigante persegue João, mas João consegue descer o pé de feijão mais rapidamente o corta com um machado.


"Há muitos e muitos anos existiu uma viú­va que tinha um filho chamado João.
João e a mãe eram muito pobres e, para se manterem, contavam apenas com uma vaca, cujo leite vendiam na cidade.
Um dia, porém, a vaca parou subitamen­te de dar leite, e a pobre mulher, tendo per­dido assim a fonte de seu sustento, ficou preocupada e sem saber o que fazer.
João, de sua parte, começou a procurar um emprego, com o qual pudesse ajudar a mãe. Mas os dias foram passando sem que ele arranjasse coisa alguma para fazer. As­sim, a única solução que encontraram foi vender a vaca, pois o dinheiro daria pelo me­nos para viverem por algum tempo.
João logo se ofereceu para ir vender o animal na cidade, mas a mãe, achando que ele não saberia negociar, a princípio não con­sentiu. Entretanto, porque ela própria pode­ria sair de casa naquele dia, não teve outro remédio senão concordar com a idéia. Amar­rou então uma corda no pescoço da vaca, para que João não a perdesse e, depois de dar muitos conselhos ao filho, deixou-o partir.
E lá se foi João, com destino à cidade.
Quando estava no meio do caminho, en­controu um vendedor ambulante que o cum­primentou muito simpático e perguntou-lhe aonde estava indo com a vaca.
Assim que João contou que estava indo vendê-la na cidade, o homem tirou do bolso um punhado de feijões, muito bonitos e de co­res e formatos variados, e mostrou-os ao me­nino, dizendo que eles eram encantados.
João ficou deslumbrado com a beleza dos grãos e, ao ouvir as palavras do vendedor, seus olhos brilharam de alegria. Morrendo de vontade de possuir os feijões encantados, perguntou ao homem se ele não gostaria de trocá-los pela vaca.
O vendedor concordou prontamente com a troca. E, horas depois, João chegava em casa muito satisfeito, achando que havia feito um excelente negócio. (...)"

sábado, 20 de março de 2010

Frankenstein

Frankenstein ou o Moderno Prometeu (Frankenstein: or the Modern Prometheus, no original em inglês), mais conhecido simplesmente por Frankenstein, é um romance de terror gótico com inspirações do movimento romântico, de autoria de Mary Shelley, escritora britânica nascida em Londres. O romance relata a história de Victor Frankenstein, um estudante de ciências naturais que constrói um monstro em seu laboratório. Mary Shelley escreveu a história quando tinha apenas 19 anos, entre 1816 e 1817, e a obra foi primeiramente publicada em 1818, sem crédito para a autora na primeira edição. Atualmente costuma-se considerar a versão revisada da terceira edição do livro, publicada em 1831, como a definitiva.
O romance obteve grande sucesso e gerou todo um novo gênero de horror, tendo grande influência na literatura e cultura popular ocidental.


Em 1815 o Monte Tambora na ilha de Sumbawa, na atual Indonésia, entrou em erupção. Como consequência, um milhão e meio de toneladas de poeira foram lançadas na atmosfera, bloqueando a luz solar, deixando o ano de 1816 sem verão no hemisfério norte.
Neste ano, Mary Shelley, então com 19 anos e ainda com o nome de solteira Mary Wollstonecraft Godwin, e seu futuro marido, Percy Bysshe Shelley, foram passar o verão a beira do Lago Léman, onde também se encontrava o amigo e escritor Lord Byron. Forçados a ficar confinados por vários dias em ambiente fechado pelo clima hostil anormal para a época e local, os três e mais outro hóspede, o também escritor John Polidori, passavam o tempo lendo uns para os outros historias de horror, principalmente histórias de fantasmas alemãs traduzidas para o francês.
Eventualmente Lord Byron propôs que os quatro escrevessem, cada um, uma história de fantasmas. Byron escreveu um conto que usaria em parte mais tarde na conclusão de seu poema Mazzepa. Inspirado por outro fragmento de história de Byron desta época, Polidori mais tarde escreveria o romance “O Vampiro”, que seria a primeira história ocidental contendo o vampiro como conhecemos hoje, e que décadas depois inspiraria Bram Stoker no seu Drácula. Porém, passados vários dias, Mary Shelley ainda não conseguira criar uma história. Eventualmente ela veio a ter uma visão sobre um estudante dando vida a uma criatura. Essa visão tornou-se a base da história de Frankenstein, a qual Mary Shelley veio a desenvolver em um romance, encorajada pelo seu futuro marido.
Desta forma, é curioso notar que o Frankenstein e o Vampiro vieram a ter sua gênese literária na mesma ocasião.
Shelley relatou sua versão da gênese da história no prefácio à terceira edição de seu romance.


Embora a cultura popular tenha associado o nome Frankenstein à criatura, esta não é nomeada por Mary Shelley. Ela é referida como “criatura”, “monstro”, “demônio”, “desgraçado” por seu criador. Após o lançamento do filme Frankenstein em 1933 o público passou a chamar assim a criatura. Isso foi adotado mais tarde em outros filmes. Alguns argumentam que o monstro é, de certa forma, um “filho” de Victor, e portanto pode ser chamado pelo mesmo sobrenome.
Frankenstein é o antigo nome de uma antiga cidade na Silésia, local de origem da família Frankenstein. Mary Shelley teria conhecido um membro desta família, o que possivelmente influenciou sua criação.


"Meu criador... por acaso te pedi que me tirasse da escuridão, que me desse a vida? Agora me despreza, foge de mim... você que me criou?"

sexta-feira, 19 de março de 2010

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"Dreams are illustrations from the book your soul is writing about you."


((Marsha Norman ))



Sonhos são ilustrações do livro que a sua alma escreve sobre você.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Adélia Prado

Com licença poética

"Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou."


"Uma das mais remotas experiências poéticas que me ocorre é a de uma composição escolar no 3º ano primário, que eu terminava assim: "Olhai os lírios do campo. Nem Salomão, com toda sua glória, se vestiu como um deles...".

A professora tinha lido este evangelho na hora do catecismo e fiquei atingida na minha alma pela sua beleza. Na primeira oportunidade aproveitei a sentença na composição que foi muito aplaudida, para minha felicidade suplementar. Repetia em casa composições, poesias, era escolhida para recitá-las nos auditórios, coisa que durou até me formar professora primária. Tinha bons ouvintes em casa. Aplaudiam a filha que tinha "muito jeito pra essas coisas". Na adolescência fiz muitos sonetos à Augusto dos Anjos, dando um tom missionário, moralista, com plena aceitação do furor católico que me rodeava. A palavra era poderosa, podia fazer com ela o que eu quisesse."


Adélia Luzia Prado Freitas nasceu em Divinópolis, Minas Gerais, no dia 13 de dezembro de 1935, filha do ferroviário João do Prado Filho e de Ana Clotilde Corrêa. Leva uma vidinha pacata naquela cidade do interior: inicia seus estudos no Grupo Escolar Padre Matias Lobato e mora na rua Ceará.

No ano de 1950 falece sua mãe. Tal acontecimento faz com que a autora escreva seus primeiros versos. Nessa época conclui o curso ginasial no Ginásio Nossa Senhora do Sagrado Coração, naquela cidade.No ano seguinte inicia o curso de Magistério na Escola Normal Mário Casassanta, que conclui em 1953. Começa a lecionar no Ginásio Estadual Luiz de Mello Viana Sobrinho em 1955.

Em 1958 casa-se, em Divinópolis, com José Assunção de Freitas, funcionário do Banco do Brasil S.A. Dessa união nasceriam cinco filhos: Eugênio (em 1959), Rubem (1961), Sarah (1962), Jordano (1963) e Ana Beatriz (1966).

Antes do nascimento da última filha, a escritora e o marido iniciam o curso de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis. Em 1972 morre seu pai e, em 1973, forma-se em Filosofia. Nessa ocasião envia carta e originais de seus novos poemas ao poeta e crítico literário Affonso Romano de Sant'Anna, que os submete à apreciação de Carlos Drummond de Andrade.


"Moça feita, li Drummond a primeira vez em prosa. Muitos anos mais tarde, Guimarães Rosa, Clarisse. Esta é a minha turma, pensei. Gostam do que eu gosto. Minha felicidade foi imensa.Continuava a escrever, mas enfadara-me do meu próprio tom, haurido de fontes que não a minha. Até que um dia, propriamente após a morte do meu pai, começo a escrever torrencialmente e percebo uma fala minha, diversa da dos autores que amava. É isto, é a minha fala."


Em 1975, Drummond sugere a Pedro Paulo de Sena Madureira, da Editora Imago, que publique o livro de Adélia, cujos poemas lhe pareciam "fenomenais". O poeta envia os originais ao editor daquele que viria a ser Bagagem. No dia 09 de outubro, Drummond publica uma crônica no Jornal do Brasil chamando a atenção para o trabalho ainda inédito da escritora.


"Bagagem, meu primeiro livro, foi feito num entusiasmo de fundação e descoberta nesta felicidade. Emoções para mim inseparáveis da criação, ainda que nascidas, muitas vezes, do sofrimento. Descobri ainda que a experiência poética é sempre religiosa, quer nasça do impacto da leitura de um texto sagrado, de um olhar amoroso sobre você, ou de observar formigas trabalhando."



domingo, 14 de março de 2010

O Mágico de Oz

O Mágico de Oz (português brasileiro) ou Feiticeiro de Oz (português europeu) é o nome pelo qual é conhecido o personagem fictício dos livros da série sobre a Terra de Oz, do escritor norte-americano L. Frank Baum, que assume o papel de bruxo para dominar e ser reconhecido.
O Mágico surge logo no primeiro livro, The Wonderful Wizard of Oz, como morador da Cidade das Esmeraldas, fundada por ele mesmo, na Terra de Oz - um mundo fantástico, povoado por vários povos e dominado por bruxas más a Leste e a Oeste.

O Mágico é apresentado como um velho artista de circo, que tinha sido um mágico ilusionista, que é levado num balão desgovernado para Oz. Ali chegando, para proteger-se das bruxas, finge ser um poderoso feiticeiro e cria, mediante muitos truques, o mito de que é verdadeiramente um bruxo.
Procurado pela garota Dorothy Gale, é revelado seu segredo. Após ter esta derrotado as duas bruxas más, o Mágico tenta regressar ao mundo real com ela, construindo um novo balão - mas este parte sem ela, acidentalmente.


O Mágico retorna a Oz, junto à Dorothy,e um burro no quarto livro da série - embora a Terra de Oz propriamente dita não figure no enredo, já que ambos, junto ao garoto Zeb, um cavalo de charrete e a nova amiguinha de Dorothy, uma gatinha chamada Eureka, enfrentam novos perigos e aventuras num mundo subterrâneo.
Neste volume, Baum revela que Oz trabalhava num circo chamado Bailum & Barney, que além de três picadeiros, tinha um zoológico itinerante.

Porco e Pimenta

"Por um minuto ou dois Alice parou olhando para a casa, tentando imaginar o que fazer a seguir, quando repentinamente um lacaio vestido com libré apareceu correndo vindo da direção da floresta — (ela considerou que ele era um lacaio porque vestia um libré; por outro lado, julgando apenas pelo seu rosto, poderia chamá-lo de peixe) — e bateu com estardalhaço na porta com os nós dos dedos. Quem abriu foi outro lacaio de libré, com uma cara bem redonda, e olhos grandes como um sapo; e ambos os lacaios, Alice notou, tinham os cachos dos cabelos empoados. Ela estava muito curiosa para saber o que se passava e rastejou para fora da floresta para ouvir. O Peixe-Lacaio começou por retirar por debaixo do braço uma enorme carta, quase tão grande como ele mesmo, e a estendeu para o outro, dizendo, num tom solene: “Para a Duquesa. Um convite da Rainha para jogar críquete.” O Sapo-Lacaio repetiu, no mesmo tom solene, apenas mudando a ordem das palavras um pouquinho: “Da Rainha. Um convite para a Duquesa jogar críquete.” Então, ambos fizeram uma reverência, e seus cachos embaraçaram-se. Alice riu tanto disso, que teve que correr de volta para a floresta de medo que eles a tivessem ouvido; e, quando ela espiou novamente, o Peixe-Lacaio já tinha ido embora e o outro estava sentado no chão perto da porta, olhando fixo estupidamente para o céu. Alice dirigiu-se timidamente até a porta, e bateu. “Não adianta nada bater”, disse o Lacaio, “e por dois motivos. Primeiro, porque estou no mesmo lado da porta que você, segundo, porque eles estão fazendo muito barulho lá dentro, ninguém vai ouvi-la.” E certamente havia um barulho muito extraordinário acontecendo lá — constantes uivos e espirros e de vez em quando um enorme barulho de coisa quebrando, como se um prato ou um chaleira estivesse sendo quebrada em pedacinhos. “Por favor, então”, disse Alice, “como eu posso entrar?” “Haveria alguma razão em você bater na porta”, o Lacaio continuou, sem dar importância a Alice, “se houvesse uma porta entre nós. Por exemplo, se você estivesse dentro, você poderia bater, e eu poderia deixar você sair, certo?” Ele olhava para o céu durante todo o tempo que falava, e isso Alice achou decisivamente grosseiro. “Mas talvez ele não possa evitar”, a menina disse para si mesma, “seus olhos são tão perto do fim da cabeça. Mas de qualquer maneira ele poderia responder as perguntas. Como eu posso entrar?”, ela repetiu em voz alta. “Eu tenho que ficar aqui”, o Lacaio retomou, “até amanhã.” Neste momento a porta da casa abriu-se e um prato grande veio voando diretamente até o nariz do Lacaio, machucando seu nariz e terminando por quebrar-se em mil pedaços contra uma das árvores atrás dele. “...ou no outro dia, talvez”, o Lacaio continuou no mesmo tom, como se nada tivesse acontecido. “Como eu posso entrar?”, perguntou mais uma vez Alice, mais alto ainda. “Você ainda quer entrar?”, disse o Lacaio. “Esta é a primeira pergunta, você sabe.” Isso era, sem dúvida: apenas Alice não gostou que lhe dissessem isso. “É realmente espantoso”, murmurou para si mesma, “a maneira com que essas criaturas falam. É o suficiente para deixar qualquer um maluco!” O Lacaio parecia pensar que aquela seria uma boa oportunidade de repetir sua fala, com variações. “Eu devo sentar aqui”, disse ele, “de vez em quando, por dias e dias”. “Mas o que eu posso fazer?” disse Alice. “Nada que você goste”, disse o Lacaio e começou a assoviar. “Oh, não adianta falar com ele,” disse Alice desesperadamente, “ele é completamente idiota!” Ela então abriu a porta e entrou. A porta dava diretamente para uma grande cozinha, que estava cheia de fumaça de um lado ao outro: a Duquesa estava sentada num tamborete de três pernas bem no meio, embalando um bebê. A cozinheira estava inclinada sobre o fogo, mexendo um enorme caldeirão que parecia estar cheio de sopa. “Certamente temos muita pimenta na sopa!”, Alice disse para si mesma, ao mesmo tempo que espirrava. Havia certamente muita pimenta no ar. Mesmo a Duquesa espirrava ocasionalmente; o mesmo acontecia com o bebê, que espirrava e uivava alternadamente, sem um momento de pausa. As únicas duas criaturas na cozinha que não espirravam eram a cozinheira e um grande gato, que estava deitado no centro e sorria de orelha a orelha. “Por favor, a senhora poderia me dizer”, perguntou Alice timidamente, pois não estava muito certa se era educado falar primeiro, “porque seu gato sorri desse jeito?” “Porque ele é um Gato de Cheshire”, respondeu a Duquesa, “é por isso. Porco!” Ela pronunciou a última palavra com tanta violência que Alice deu um pulo; mas ela percebeu no instante seguinte que o chamado era dirigido ao bebê, e não a ela, então armou-se de coragem e tentou novamente: “Eu não sabia que os gatos de Cheshire sempre sorriam, de fato, eu nunca soube que gatos pudessem sorrir.” “Todos eles podem”, afirmou a Duquesa, “e muitos deles o fazem.” “Eu não conheço nenhum”, disse Alice muito polidamente, sentindo-se agradecida por ter conseguido iniciar uma conversa. “Você não sabe muito”, disse a Duquesa, “e isso é um fato.” Alice não gostou do tom da voz da Duquesa, e pensou que seria melhor introduzir um outro tema de conversa. Enquanto ela tentava encontrar um, a cozinheira tirou o caldeirão de sopa do fogo e começou a atirar sobre a Duquesa e o bebê todos os objetos que via pela frente — os atiçadores de fogo vieram primeiro, depois uma chuvarada de panelas de molho, pratos e louças. A Duquesa não ligava para nada, mesmo quando um dos utensílios a atingia: e o bebê estava uivando tanto, que era impossível dizer se os projéteis machucavam ou não. “Oh, por favor, veja o que a senhora está fazendo!”, gritou Alice, pulando de um lado para outro com agonia e terror. “Oh, lá vai seu precioso nariz” pois um enorme caçarola voou bem perto do bebê, e por muito pouco não o carregou. “Se cada um se preocupasse com seus próprios negócios”, disse a Duquesa, rosnando roucamente, “o mundo giraria mais rápido do que gira.” “O que não seria uma vantagem”, respondeu Alice, que sentia-se muito feliz pela oportunidade de mostrar um pouco do seu conhecimento. “Eu fico pensando que trabalho deve ser fazer o dia e a noite! A senhora vê, a terra leva vinte e quatro horas para girar em torno do seu eixo...” “Falando em eixos”, disse a Duquesa, “cortem a cabeça dela!” Alice olhou de soslaio ansiosamente para a cozinheira, para ver se ela iria seguir a sugestão; mas a cozinheira estava muito ocupada emxendo a sopa e parecia não ouvir nada; então, ela continuou: “Vinte e quatro horas, eu acho, ou seriam vinte? Eu...”(...)"


((Capítulo VI - Alice no País das Maravilhas))

Rosa Branca e Rosa Vermelha

Rosa Vermelha é a irmã gêmea da Branca de Neve. Durante séculos as duas tiveram uma relação meio estremecida porque Rosa sempre teve ciúme do sucesso da irmã e, com isso, fazia de tudo para irritá-la, como dormir com o Príncipe Encantado.
No começo da história, o atrito das duas é constante. Depois do fiasco envolvendo João e Barba Azul, ela acabou por se redimir e se tornou a administradora da Fazenda.
Atualmente mantém uma relação amigável com a irmã.
No Brasil, o conto estrelado por Rosa Vermelha é mais conhecido como “Rosa-Branca e Rosa-Vermelha”, apesar de seu nome original ser “Snow-White and Rose-Red” (Branca de Neve e Rosa Vermelha).

"Uma pobre viúva vivia isolada numa pequena cabana. Em seu jardim havia duas roseiras: em uma florescia rosas brancas, e, na outra, rosas vermelhas. A mulher tinha duas filhas que se pareciam com as roseiras: uma chamava-se Rosa-Branca; a outra Rosa Vermelha. As crianças eram obedientes e trabalhadeiras. Rosa-Branca era mais séria e mais meiga que a irmã. Rosa Vermelha gostava de correr pelos campo: Rosa-Branca preferia ficar em casa ajudando a mãe. As duas crianças amavam-se muito e quando saíam juntas, andavam de mãos dadas…
Elas passeavam sozinhas na floresta, colhendo amoras. Os animais não lhes faziam mal nenhum e se aproximavam delas sem temor. Nunca lhes acontecia mal algum. Se a noite as surpreendia na floresta elas se deitavam na relva e dormiam.
Uma vez, passaram a noite na floresta e, quando a aurora as despertou, viram uma linda criança, toda vestida de branco sentada ao seu lado. A criança levantou-se, olhou com carinho para elas e desapareceu na floresta.
Então viram que tinham estado deitadas à beira de um precipício e teriam caído nele se houvessem avançado mais dois passos na escuridão. Contaram o fato à mãe que lhes disse ser provavelmente o anjo da guarda que vigia as crianças.
As meninas mantinham a choupana da mãe bem limpa. Durante o verão, era Rosa-Vermelha que tratava dos arranjos da casa e no inverno, era Rosa-Branca. Á noite, quando a neve caía branquinha e macia, Rosa-Branca fechava os ferrolhos da porta.
À noite sentavam perto da lareira e enquanto a mãe lia em voz alta num grande livro as mãozinhas das meninas fiavam; aos pés delas, deitava-se um cordeirinho, e atrás, em cima do poleiro, uma pomba muito branca dormia com a cabeça entre as asas.
Uma noite, quando estavam assim tranqüilamente, ouviram bater à porta e a mãe mandou Rosa-Vermelha abrir a porta pois devia ser alguém procurando abrigo.
Ao abrir a porta Rosa-Vermelha … um enorme urso que meteu a grande cabeça … através da abertura da porta. Ela soltou um grito e correu para o quarto; o cordeirinho pôs-se a balir, a pomba a voar, e Rosa-Branca se escondeu atrás da cama da mãe. (...)"

segunda-feira, 8 de março de 2010

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"— Se minha mão profana o relicário em remissão aceito a penitência: meu lábio, peregrino solitário, demonstrará, com sobra, reverência.
— Ofendeis vossa mão, bom peregrino, que se mostrou devota e reverente. Nas mãos dos santos pega o paladino. Esse é o beijo mais santo e conveniente.
— Os santos e os devotos não têm boca?
— Sim, peregrino, só para orações.
— Deixai, então, ó santa! que esta boca mostre o caminho certo aos corações.
— Sem se mexer, o santo exalça o voto.
— Então fica quietinha: eis o devoto. Em tua boca me limpo dos pecados. (Beija-a.)
— Que passaram, assim, para meus lábios.
— Pecados meus? Oh! Quero-os retornados. Devolve-mos."


((Romeu e Julieta - William Shakespeare))

Charles Baudelaire

Charles-Pierre Baudelaire foi um poeta e teórico da arte francês. É considerado um dos precursores do Simbolismo, embora tenha se relacionado com diversas escolas artísticas. Sua obra teórica também influenciou profundamente as artes plásticas do século XIX.
Nasceu em Paris a 9 de abril de 1821. Estudou no Colégio Real de Lyon e Colégio Louis-Le-Grand (de onde foi expulso por não querer mostrar um bilhete que lhe foi passado por um colega).
Em 1840 foi enviado pelo padrasto, preocupado com sua vida desregrada, à Índia, mas nunca chegou ao destino. Pára na ilha da Reunião e retorna a Paris. Atingindo a maioridade, ganha posse da herança do pai. Por dois anos vive entre drogas e álcool na companhia da mulata Jeanne Duval. Em 1844 sua mãe entra na justiça, acusando-o de pródigo, e então sua fortuna torna-se controlada por um notário.

Em 1857 é lançado As flores do mal contendo 100 poemas. O livro é acusado no mesmo ano, pelo poder público, de ultrajar a moral pública. Os exemplares são presos, o escritor paga 300 francos e a editora 100, de multa.
Essa censura se deveu a apenas seis poemas do livro. Baudelaire aceita a sentença e escreveu seis novos poemas "mais belos que os suprimidos", segundo ele.



Mesmo depois disso, Baudelaire tenta ingressar na Academia Francesa. Há divergência, entre os estudiosos, sobre a principal razão pela qual Baudelaire tentou isso. Uns dizem que foi para se reabilitar aos olhos da mãe (que dessa forma lhe daria mais dinheiro), e outros dizem que ele queria se reabilitar com o público em geral, que via suas obras com maus olhos em função das duras críticas que ele recebia da burguesia.
Morre em 1867, em Paris, e seu corpo está sepultado no Cemitério do Montparnasse, em Paris.





"Que há de mais absurdo que o progresso, já que o homem, como está provado pelos fatos de todos os dias, é sempre igual e semelhante ao homem, isto é, sempre em estado selvagem."

CAPÍTULO XXXII / OLHOS DE RESSACA

"Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles, "olhos de cigana oblíqua e dissimulada." Eu não sabia o que era obliqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira, eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que lhe deu outra idéia do meu intento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que entrassem a ficar crescidos, crescidos e sombrios, com tal expressão que...Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me."

((Dom Casmurro - Machado de Assis))

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"The human heart has hidden treasures, in secret kept, in silence sealed; thoughts, the hopes, the dreams, whose charms were broken if revealed."



((Charlotte Bronte))


O coração humano esconde tesouros, em cada segredo guardado, em um silêncio selado; pensamentos, esperanças, sonhos, dos quais o charme é quebrado se forem revelados.

domingo, 7 de março de 2010

Chapeuzinho Vermelho

Fonte inesgotável de questionamentos literários, o conto Capuchinho/Chapeuzinho Vermelho, já se deu a leituras que abrangem da psicanálise, da paródia e da paráfrase, ao mundo das histórias em quadrinhos. Antes de Charles Perrault, a mitologia grega possuía seu modo particular de transmiti-la, e depois sofreu alterações por Hans Christian Andersen e pelos Irmãos Grimm.

Os séculos XX e XXI, trouxeram ainda novas versões: a irreverência e o deboche em Dalton Trevisan, os desenhos de Maurício de Sousa atraindo o público mais infantil, Neil Gaiman impressionando seus leitores ao expôr uma Capuchinho/Chapeuzinho inclinada para o mal, e Deu a louca na Chapeuzinho, filme de 2005 com paródia dos personagens.

Guimarães Rosa, em Fita verde no cabelo, traz uma versão para adolescentes. Ela vai desde o fluxo das fantasias de uma jovem até o momento em que se defronta com a morte de sua avó, sendo desta forma, obrigada a enfrentar seus medos, angústias e solidão. Chico Buarque faz uma paródia, Chapeuzinho Amarelo, para o público pré-adolescente.



A história atual todos nós conhecemos: chapeuzinho vermelho, lobo mau, vovozinha e lenhador... Não preciso explicar certo!? Mas, na história original o lenhador não existe, na verdade a chapeuzinho e sua vovó são devoradas e pronto, parou por ai, nada de final feliz aqui.
Em outra versão ainda mais antiga, a chapeuzinho faz um strip-tease pro lobo (que as vezes era representado por um lobisomem ou um ogro) para assim poder fugir enquanto ele esta "distraído". Existe ainda uma versão mais bizarra ainda da história, onde o lobo estripa a vovó e obriga a chapeuzinho a jantá-la com ele. A chapeuzinho, que não é besta, diz que precisa ir ao banheiro (que naquela época ficava do lado de fora das casas) e fugia. Percebam que, em todas as versões que citei, o lobo sempre se dá bem no final, de uma forma ou de outra.

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"Red Cap", título original da história, foi um conto originalmente falado, e depois escrito pelos Irmãos Grimm, como todos os outros contos deles.





Conselho de uma lagarta

"A Lagarta e Alice olharam-se uma para outra por algum tempo em silêncio: por fim, a Lagarta tirou o narguilé da boca, e dirigiu-se à menina com uma voz lânguida, sonolenta. “Quem é você?”, perguntou a Lagarta. Não era uma maneira encorajadora de iniciar uma conversa. Alice retrucou, bastante timidamente: “Eu — eu não sei muito bem, Senhora, no presente momento — pelo menos eu sei quem eu era quando levantei esta manhã, mas acho que tenho mudado muitas vezes desde então. “O que você quer dizer com isso?”, perguntou a Lagarta severamente. “Explique-se!” “Eu não posso explicar-me, eu receio, Senhora”, respondeu Alice, “porque eu não sou eu mesma, vê?” “Eu não vejo”, retomou a Lagarta. “Eu receio que não posso colocar isso mais claramente”, Alice replicou bem polidamente, “porque eu mesma não consigo entender, para começo de conversa, e ter tantos tamanhos diferentes em um dia é muito confuso.” “Não é”, discordou a Lagarta. “Bem, talvez você não ache isso ainda”, Alice afirmou, “mas quando você transformar-se em uma crisálida — você irá algum dia, sabe — e então depois disso em uma borboleta, eu acredito que você irá sentir-se um pouco estranha, não irá?” “Nem um pouco”, disse a Lagarta. “Bem, talvez seus sentimentos possam ser diferentes”, finalizou Alice, “tudo o que eu sei é: é muito estranho para mim.” “Você!”, disse a Lagarta desdenhosamente. “Quem é você?” O que as trouxe novamente para o início da conversação. Alice sentia-se um pouco irritada com a Lagarta fazendo tão pequenas observações e, empertigando-se, disse bem gravemente: “Eu acho que você deveria me dizer quem você é primeiro.” “Por quê?”, perguntou a Lagarta. Aqui estava outra questão enigmática, e, como Alice não conseguia pensar nenhuma boa razão, e a Lagarta parecia estar muito chateada, a menina despediu-se. “Volte”, a Lagarta chamou por ela. “Eu tenho algo importante para dizer!” Isso soava promissor, certamente. Alice virou-se e voltou. “Mantenha a calma”, disse a Lagarta. “Isso é tudo?”, retrucou Alice,engolindo sua raiva o quanto pôde. “Não”, respondeu a Lagarta. Alice pensou que poderia muito bem esperar, já que não tinha nada para fazer, e talvez no fim das contas ela poderia dizer algo que valesse a pena. Por alguns minutos a Lagarta soltou baforadas do seu cachimbo sem falar; afinal, ela descruzou os braços, tirou o narguilé da boca novamente e disse: “Então você acha que mudou, não é?” “Temo que sim, Senhora”, respondeu Alice. “Não consigo lembrar das coisas como antes — e não mantenho o mesmo tamanho nem por dez minutos!” “Não consegue lembrar que coisas?”, continuou a Lagarta. (...)"

((Alice no País das Maravilhas - Lewis Carroll))

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"Above all, don’t lie to yourself. The man who lies to himself and listens to his own lie comes to a point that he cannot distinguish the truth within him, or around him, and so loses all respect for himself and for others. And having no respect he ceases to love."



((Fyodor Dostoevsky))










Acima de tudo, não minta pra você mesmo. O homem que mente pra si mesmo e dá ouvido a suas próprias mentiras chega à um ponto onde ele não consegue distinguir a verdade dentro de si, ou ao seu redor, então ele perde todo o respeito por si mesmo e pelos outros. E não tendo respeito, ele cessa o amor.

Clarice Lispector

“[...] Quando criança, e depois adolescente, fui precoce em muitas coisas. Em sentir um ambiente, por exemplo, em apreender a atmosfera íntima de uma pessoa. Por outro lado, longe de precoce, estava em incrível atraso em relação a outras coisas importantes. Continuo, aliás, atrasada em muitos terrenos. Nada posso fazer: parece que há em mim um lado infantil que não cresce jamais.Até mais que treze anos, por exemplo, eu estava em atraso quanto ao que os americanos chamam de fatos da vida. Essa expressão se refere à relação profunda de amor entre um homem e uma mulher, da qual nascem os filhos. [...] Depois, com o decorrer de mais tempo, em vez de me sentir escandalizada pelo modo como uma mulher e um homem se unem, passei a achar esse modo de uma grande perfeição. E também de grande delicadeza. Já então eu me transformara numa mocinha alta, pensativa, rebelde, tudo misturado a bastante selvageria e muita timidez. Antes de me reconciliar com o processo da vida, no entanto, sofri muito, o que poderia ter sido evitado se um adulto responsável se tivesse encarregado de me contar como era o amor. [...] Porque o mais surpreendente é que, mesmo depois de saber de tudo, o mistério continuou intacto. Embora eu saiba que de uma planta brota uma flor, continuo surpreendida com os caminhos secretos da natureza. E se continuo até hoje com pudor não é porque ache vergonhoso, é por pudor apenas feminino.Pois juro que a vida é bonita.”



Ao mesmo tempo que ousava desvelar as profundezas de sua alma em seus escritos, Clarice Lispector costumava evitar declarações excessivamente íntimas nas entrevistas que concedia, tendo afirmado mais de uma vez que jamais escreveria uma autobiografia. Contudo, nas crônicas que publicou no Jornal do Brasil entre 1967 e 1973, deixou escapar de tempos em tempos confissões que, devidamente pinçadas, permitem compor um auto-retrato bastante acurado, ainda que parcial. Isto porque Clarice por inteiro só os verdadeiramente íntimos conheceram e, ainda assim, com detalhes ciosamente protegidos por zonas de sombra. A verdade é que a escritora, que reconhecia com espanto ser um mistério para si mesma, continuará sendo um mistério para seus admiradores, ainda que os textos confessionais aqui coligidos possibilitem reveladores vislumbres de sua densa personalidade.


“Madama Carlota havia acertado tudo. (...) Até para atravessar a rua ela era outra pessoa. Uma pessoa grávida de futuro. Sentia em si uma esperança tão violenta como jamais sentira tamanho desespero. Se ela não era mais ela mesma, isso significava uma perda que valia por um ganho. Assim como havia sentença de morte, a cartomante lhe decretara sentença de vida. Tudo de repente era muito e muito e tão amplo que ela sentiu vontade de chorar. Mas não chorou: seus olhos faiscavam como o sol que morria.Então ao dar o passo de descida da calçada para atravessar a rua, o Destino (explosão) sussurrou veloz e guloso: é agora, é já, chegou minha vez! E enorme como um transatlântico o Mercedes amarelo pegou-a (...)”

((A Hora da Estrela))

“Sou tão misteriosa que não me entendo.”
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Fonte: www.claricelispector.com.br